sábado, 30 de janeiro de 2016

Apps e Dates Pela Net

"Muitas vezes, quando estou a lavar a louça e a ouvir a Antena 1, passam músicas muito giras, mas depois nunca dizem quem é o artista. Felizmente, existe o Shazam."

segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

C'me On, Give Us A Break!

Maria Inês cresceu brincando com suas Barbies, claramente a minha atividade favorita durante muitos e felizes anos. Eu gostava da escola, gostava de ler, gostava do ballet, um pouco menos da natação, gostava ao quadrado de ver televisão. Nunca dei muita importância aos nenucos, nem ao ferro de engomar nem ao aspirador. As minhas Barbies eram tudo para mim. Foram muitas horas dedicadas ao faz-de-conta. As minhas Barbies eram mulheres lindíssimas que interpretavam lindamente os papéis que eu lhes atribuía, e foram muitos - do infantário ao 2º ciclo podem imaginar que os enredos variam consideravelmente. Não perguntem pormenores, que já não me lembro. Lembro-me, contudo, que eram mulheres trabalhadoras. As minhas Barbies nunca foram donas-de-casa (todo o respeito pelas mesmas), as minhas Barbies tinham namorados, por vezes dava um certo encanto à história, mas as suas vidas não giravam à volta disso. Elas tinham os mais diversos objetivos e preocupações.
Eu nunca pensei que houvesse grande diferença entre meninos e meninas, exceptuando algumas preferências de passatempos, claro, eu nunca consegui gostar, verdadeiramente, de praticar nenhum desporto. O meu irmão nunca me fez companhia e às bonecas, por muito bem-vindo que fosse. Mas como diz o outro, os gostos não se discutem. E eu, efetivamente, sempre achei que não se discutiam. Eu nunca acreditei que houvesse grande diferença entre meninos e meninas. A minha mãe pedia-me para levantar a mesa noventa e cinco por cento das vezes, ao meu irmão cinco, mas é porque ele nunca faz o que lhe peço, não queres ser preguiçosa como ele, pois não? Não, mãe, eu ajudo. E, de facto, nunca notei grande diferença, a minha avó acusava-me de ser desarrumada e de não ajudar a minha mãe, enquanto preparava o pão com marmelada para o meu irmão lanchar. Mas mais vais levar essa mini-saia para a escola? menos olha-me para esse cabelo, parece impossível, a verdade é que ela não fazia grande distinção.  Eu até estou convicta que era a neta preferida da minha avó, ela só não queria que eu percebesse. 

Olhando para trás, talvez tenha passado mais intervalos do que gosto de admitir ocupada a criticar cada uma das minhas colegas, à vez à vez. Eram muitas e uma pessoa tem de dissecar os defeitos com calma, não dá para ser tudo ao mesmo tempo, além de que eu não  posso dizer à Ana que a Ana é uma falsa. Isso eu digo à Joana. Quando estou com a Ana, falo mal da Rita. Não é uma atividade assim tão simples. Ninguém estranhava muito, é uma coisa cultural e as tradições são para respeitar. Os rapazes falavam de desporto e jogos de vídeo, mas isso é porque o cérebro deles não tem a capacidade de ouvir atentamente a última cusquice enquanto fotografa mentalmente a nova blusa, mais decotada que nunca, da melhor amiga. Das duas uma, ou eles não são tão perspicazes, ou quem sabe, eles não são educados enviesadamente para reparar em tudo o que acontece, tudo o que não acontece e para analisar todas as razões pelas quais poderá ou não ter acontecido. Assuntos demasiado elevados para aquelas cabecinhas simplórias.

Francamente, tão dedicada que estive, durante tanto tempo, a dominar a dinâmica social e conseguir sempre ter assunto de conversa, não me fui apercebendo que afinal, não é só naqueles países horríveis de terceiro mundo, onde até tapam as mulheres, que se sente descriminação entre sexos. 
Aos vinte e quatro anos de idade, ainda eu uma criança com a vida pela frente e o mundo a meus pés, já não tenho um almoço de família sem e quando temos o próximo casamento, Inês? Confesso que fico com alguma pena do meu irmão que é mais velho do que eu, mas com o qual ninguém se preocupa. Então ele não merece igual preocupação e carinho? Só se lembram de mim, um dia destes ele vai reparar que é posto de parte e há-de ficar magoado com a desconsideração. Bem como estou certa que também ele gostaria de ouvir o manual de Como fazer com que o teu yorkshire terrier cônjuge te seja fiel e submisso - truques e dicas. Não é justo!


Uma vez um colega disse-me que escrevo como um rapaz, nunca percebi o significado disso, mas ponho-me a imaginar o que será viver como um rapaz. Imagino que seja um tanto mais fácil do que viver como uma rapariga. Sim, em Portugal, não falo no Médio-Oriente ou na Índia. Sei lá, ser rapaz e não ter de ouvir de um empregador ah, eu precisava mesmo era de contratar um homem, já cá tenho muitas mulheres e depois fica aquele ambiente de salão de cabeleireiro. Não ter de ver algumas amigas tão ansiosas para encontrar o amor da vida delas um homem que as leve ao altar.

As minhas Barbies eram muito mais relaxadas, intrinsecamente livres nas suas escolhas. Eventualmente, o Ken poderia vir a ser o centro das suas vidas, aquele Ken especial, não a urgência de um Ken que dê sentido a uma existência. Acima de tudo, as minhas Barbies sabiam que não existe uma fórmula da vida no masculino e outra no feminino. Elas sabiam que existem tantas fórmulas para a felicidade, quantas há indivíduos.

Eu nunca me safei de uma aula de educação física com a desculpa da menstruação (e só eu sei como gostaria de o ter feito), nunca usei o facto de ser mulher para justificar fragilidades ou para me queixar da vida. Até porque nunca tinha sentido, realmente, que fosse uma desvantagem. Mas não há como negar que é. Não há como negar que os homens partem com uma vantagem histórica, que não parece esbater-se. Custa-me admitir, mas é verdade, que "tão gaja", é dos adjetivos com uma conotação mais negativa que temos. E, c'um caraças, as gajas são mesmo chatas, só estão bem agarradas a mandar mensagens o dia todo, são tão temperamentais, mesquinhas e complicadas. Mas estão a falar de quem? A maior parte das raparigas que eu conheço não encaixa neste perfil, também a maior parte dos rapazes que conheço não é um carneiro mal morto desejoso de ser manipulado por uma gaja passivo-agressiva que faz greve de sexo de cada vez que não leva a sua avante.


A minha professora de Ciências do 6º ano classificou a organização do meu caderno com um Satisfaz, porque para uma menina devia estar bem melhor. Já os meus testes, para menina, eram excelentes. Felizmente, naquela idade já (ou ainda) tinha a percepção da patetice que ela estava a dizer, mantive a minha letra péssima, até hoje. Igualmente, não há como não estranhar que na faculdade onde estudei, com uma esmagadora maioria de estudantes do sexo feminino, todos os cargos mais importantes (até na AE e na Praxe, sagrada Praxe), não havia mulheres. Aquelas esganiçadas!
Acontece que eu até sou uma mulher que gosta de saltos altos, de vestidos e maquilhagem, nunca percebi o que é um fora de jogo (nem tentem explicar), choro aos soluços sempre que o Leo morre por amor no Titanic, um cliché do caneco. Pretendo continuar assim, sem me preocupar com ter de usar calças para ser respeitada no trabalho e ter de usar saia para ser respeitada na vida. Permitam-me que vista o que me apetece a cada manhã.

Eu derreto-me por rapazes que se derretem por futebol, não se depilam, não pintam o cabelo, não põem base na cara... É só a minha preferência, não respeito menos um rapaz que se depile, provavelmente não vou ter fantasias com ele, mas também não lhe vou chamar nomes. Tal como não me incomodam as mulheres que têm pêlos na axila e que, valha-nos Deus!, os pintam de verde fluorescente. Notícia de última hora: as axilas da Luísa são, com efeito, da Luísa. Pronto, já que estamos nisto, deixem-me deambular um pouco mais sobre o homem dos meus sonhos, eu não sei muito sobre ele, na realidade, mas sei que é inteligente, não é um tonto que me elogia de vinte em vinte minutos, morrendo de medo que o comentário errado ligue o interruptor que me torna o monstro das hormonas. Para a maior parte das pessoas isto é evidente, essas espero que não se tenham dado ao trabalho de ler isto,  credo!, isto já vai em mais de dez parágrafos e eu não disse nada que não seja axiomático. Para os mais céticos, o facto é que não existe guerra eterna entre homens e mulheres. Os homens não são uns inúteis nem as mulheres golddiggers à procura de um marido que lhe pague as contas (chiuu, pessoas assim há em ambos os lados). 



Muito mais eloquente do que eu é a menina Adichie, ouçam-na. Eu sou só mulher, em Portugal, pobre coitada, não quero imaginar o que seja ser mulher e preta. Deve ser como jogar World of Warcraft no modo mais difícil. Não, ela ainda podia ser homossexual e portadora de deficiência (ou lá como é politicamente correto dizer). 



“ I often make the mistake of thinking that something that is obvious to me is just as obvious to everyone else. ” 

Se não têm tempo para tanto, vejam a versão resumida (<4 minutos).


E não é que a B quando resolveu escrever sobre coisas que, realmente, a interessam, fez um álbum, realmente, interessante. Ele há coisas!


The Weather Station - Tapes

Imergindo no folk, imergindo na chuva. Voz estranhamente reminiscente da Joni Mitchell.


I wish I had a river so looong.

sábado, 23 de janeiro de 2016

Tatá, a Baronesa de Lazarim

Acredita se lhe disser que plantou uma arca vitoriana mesmo ali no meio do salão. Não acha que é mesmo de quem não sabe o que fazer ao mobiliário. Se já não tinha espaço, guardava nos arrumos. Ou, se queria preencher o espaço, para não dar um ar assim tão despido à divisão, punha um confident ou um pianinho de cauda e até lhe punha em cima uma jarra da Vista Alegre Atlantis. Quem diz uma jarra diz outra peça como aqueles anjinhos com asas em biscuit sentado da edição especial, que fizeram agora para o Natal. São engraçadíssimos. Em cristal, por tudo o que é mais sagrado, em cristal, não me andem a pôr vidro. A piroseira, como umas e outras, a encher o bar com frascos e garrafas de vidro, é uma falta de estima pelo uísque malte de 20 anos. Fizesse eu tal, o Álvaro não me perdoava. É que podia esquecer a minha gargantilha nova pelo aniversário. É um querido, adora-me de morte, mas há faltas que não tolera. E é uma questão de bom senso, já se sabe que no vidro o sabor nunca é o mesmo. Mas atenção que a moda já não é o que era, a rolha diamantada, giríssima que ela é, já não se vê. Agora é tudo muito mais assim para o minimalista, sem exagero na lapidação de base e a rolha, se tiver, é um detalhezinho muito singelo. Ainda que a sua casa seja clássica, tome atenção, a menina não quer passar-se pela pindérica de Odivelas que chegou anteontem à Linha. E não deixa de ser uma delicadeza que faz à criada, a pobre criatura vai agradecer-lhe horrores por ter menos reentrâncias na hora de limpar o pó. 



quinta-feira, 21 de janeiro de 2016

The Underground Youth - Dreaming With Maya Deren

psy-psy-psychedelic nap



Não És Tu, Sou Eu

Eu estou a ouvir-te, vou só num instante lá fora, mas estou a ouvir-te. Ora essa, não pares, não interrompas o teu raciocínio, faz de conta que nem me levantei, continua imperturbável. Faz de conta que nem reparaste que não estou, que me mantenho à tua frente a olhar-te, fixamente, ora nos olhos, ora no nariz, sorrindo em anuência, a uma frequência razoável. Não me agradeças, eu sempre gostei de concordar. E eu tampouco te posso ser útil neste diálogo unilateral. Nem vais reparar que não estou, mantém a palestra ininterrupta, não faças caso de mim.
Por favor, vou só lá fora respirar, mas estou a ouvir tudo. Quando voltar, podes continuar a fazer de conta que não reparaste que estou. Antes de me levantar, deixa-me só agradecer-te por esta minuciosa autobiografia que me proporcionas, verdadeiramente envolvente. Não imagino melhor forma de passar o serão, com  franqueza, a minha vida nunca mais será a mesma. Por favor, continua que ouço cada palavra, avidamente.
Já volto. Não, não, continua a falar como se cá estivesse, não faz diferença porque não há nada que eu possa acrescentar que interesse. E, lembra-te, ainda que surja oportunidade para eu abrir a minha boca, nunca caias no erro de me dar a palavra. Vais arrepender-te, sou tão enfadonha como desconfias. Nada que valha a pena roubar tempo de antena à tua daily routine, tão eximiamente estruturada, tão bem adjectivada. E eu estou aqui para isso, para testemunhar a tua grandeza. Obrigada! Por me deixares ser figurante na tua vida, caso contrário correria o risco de ser protagonista na minha.
Vou só lá fora ver se fujo. Continua.


quarta-feira, 20 de janeiro de 2016

Shye Ben Tzur, Jonny Greenwood, and The Rajasthan Express - Roked

Vamos lá animar esta semana macilenta com um bocadinho de calor vindo das Índias. Um bocadinho de paixão ou Junun que é, aliás, o nome do álbum. Ahah, sou danada para os trocadilhos...


Jonny Greenwood, o guitarrista dos Radiohead, juntou-se ao músico/compositor israelita Ben Tzur e aos The Rajashtan Express e o resultado foi mais que interessante. Melhor do que isso, o realizador Paul Thomas Anderson documentou toda a experiência das gravações - que aconteceram num forte nas colinas de Rajastão, cedido por Sua Alteza, o marajá de Jodhpur, para o projeto - numa curta metragem.
E pronto, também vos deixo o trailer, já agora.


E muita força na vossa nobre luta, metade da semana já passou, agora é fechar os olhos, respirar fundo, e em piloto automático até sexta.

quinta-feira, 14 de janeiro de 2016

Pot Head

Vicks? Tenha lá paciência! Como o meu pai lida com o nariz entupido depois de uma rinoplastia, claramente, ineficaz. 


"Parece impossível que uma farmacêutica se espante com isto!" É verdade, estamos perante otorrinolaringologia de ponta.


Valentin-oh!

Macacos me mordam, está bué da fixe bravissimo!


quarta-feira, 13 de janeiro de 2016

Bail-out/Bail-in

Entrou em efeito a diretiva europeia que protege os contribuintes de serem os primeiros a pagar pela falência de um banco. Na linha da frente passam a estar acionistas e credores. 

"The directive establishes a bail-in system which will ensure that taxpayers will be last in the line to pay the bills of a struggling bank. In a bail-in, creditors, according to a pre-defined hierarchy, forfeit some or all of their holdings to keep the bank alive. The bail-in system will apply from 1 January 2016. 
The bail-in tool set out in the directive would require shareholders and bond holders to take the first big hits. Unsecured depositors (over €100,000) would be affected last, in many cases even after the bank-financed resolution fund and the national deposit guarantee fund in the country where it is located have stepped in to help stabilise the bank. Smaller depositors would in any case be explicitly excluded from any bail-in.
To improve a struggling bank’s recovery prospects and foster general economic stability, bail-ins would apply at least until 8% of its total assets have been lost. In most cases, this would mean shareholders and many bondholders would be wiped out. Above this threshold, the resolution authority may allow the bank to access resolution fund money up to a maximum of 5% of the bank's assets.
A member state could lodge a request with the Commission to exempt certain creditors from bail-in on an exceptional and case by case basis. The Commission would have the right to object. Moreover such exemptions would still mean that the bank would need to find 8% of its assets to bail-in before it could hope to tap other funds."


Bail-in vs. Bail-out
"Bail-out is when outside investors rescue a borrower by injecting money to help service a debt. Bail-outs of failing banks in Greece, Portugal and Iceland were primarily financed by taxpayers.   
By contrast, a bail-in forces the borrower's creditors to bear some of the burden by having part of the debt they are owed written off.  
At the height of the financial crisis, governments avoided resorting to bail-ins out of concern that it might cause panic among the creditors of other banks; even the bondholders of Irish banks were initially spared. 
But as time has passed, and the cost of government bail-outs has risen, the appeal of asking private-sector investors to take a hit has increased."

segunda-feira, 11 de janeiro de 2016

The Last Shadow Puppets - Bad Habits

Finalmente, o novo single.


#stillsinkingin
#notamazed
#expectingfurtherdevelopments


Maxime Büchi

"I am interested to re-appropriate and adapt traditional european iconography to tattooing. I grew up in an old country with a lot of medieval, renaissance and classic art all around me. It is my legacy and a lot of people identify to it. That’s my main inspiration."










 


Maxime Büchi, um dos artistas do Sang Bleu London Tattoo,  



domingo, 10 de janeiro de 2016

Mondrian - Broadway Boogie Woogie

Quando se está anos sem pôr os pés (i.e. os olhos, dedos e cérebero) no blog, é imperativo dar uma vista de olhos no lixo (i.e. rascunhos de mensagens) para fazer uma limpeza da Páscoa à casa. Ora, encontrei muitas páginas em branco, tentativas em vão de quem quer comunicar mas não tem, verdadeiramente, nada a dizer. Razão pela qual notaram (?) a minha ausência por cá. E eis que me deparo com esta imagem guardada em setembro de 2012. Não sei porque não a publiquei, é certamente uma obra que não merece ficar esquecida nos meus rascunhos. Permitam-me que corrija a falta, agora.



Esta composição,que me faz pensar automaticamente num jogo de computador do antigamente, foi o último quadro que Mondrian completou. O título dá-nos uma boa pista do que passaria na cabeça do artista que com certeza passou uns belos serões na luminosa NYC ao som de ritmos energéticos e sincopados. Boogie wooging through life...

sábado, 9 de janeiro de 2016

Courtney Barnett - Pedestrian At Best

Não que seja a melhor letra desta jovem australiana, mas estas quase-rimas não me saem da cabeça. 
Não se prendam por mim, ouçam Sometimes I Sit and Think, and Sometimes I Just Sit


Bom para variar da hi(p)steria melosa do costume.


sexta-feira, 8 de janeiro de 2016

Priscilla com dois éles como Marcello Caetano

A menina Lurdinhas e o Tavares casaram no fim do ano, que foi quando lhe deram folga na camisaria, que a clientela não espera despida à espera que ele vá ali e já venha. Ela queria ter casado no dia de Natal, em honra ao menino Jesus, que cerimónia tão linda teria sido aquela, se ao menos me tivessem deixado. Mas o pároco não achou por bem competir com Cristo dessa forma, para além de que não é época para pôr grandes enfeites na igreja.

A casa dos pais da Lurdinhas é asseada mas não é lá muito grande portanto a boda foi coisa singela, a família de um, a família do outro e pouco mais. Para compensar, a Lua de Mel foi um fartote, começando os pombinhos por pernoitar no Buçaco, sabe que aquilo custa couro e cabelo mas é fino como eu nunca vi. Vista a Serra de uma ponta à outra rumaram à Batalha atrás de ver o Mosteiro. Ai mas é muito mais bonito que a nossa igreja matriz, pena ser Inverno que dizem que quando o Sol bate forte nos vitrais é que isto é encantador a sério. Mas olha vimos os jazigos daqueles reis todos, até lá estava o Infante Dom Henrique, há que séculos que Ceuta voltou para os mouros de que lhe valeu ralar-se? Antes de voltarem para cima passaram na Nazaré que a Lulu nunca tinha visto o mar, e ai tão grande que ele é. Nem ela havia viajado até tão longe nem o Fiat Seiscentos do meu sogro andado tantos quilómetros em tão pouco tempo. Mas portou-se bem, ah pois que há para aí muita máquina que não aguentaria tanto.

Não haveria de ser fácil para a jovem esposa cumprir  o seu sonho de menina, ser mãe de outra menina ainda mais bonita e mais prendada. A certa altura já se julgava que era infértil, sequinha como um riacho em Agosto, e foi quando as regras lá tardaram a aparecer. E ela soube logo porque desde garota que era certinha como as horas (qual Kant!). Tal como soube logo que aí vinha uma menina porque a forma do ventre não engana e uma mulher sente estas coisas. Assim, nascida a bebé, dormia no seu regaço cansado das atribulações do parto, quando chegaram as visitas. E agora como lhe vais chamar? A tia do Tavares que viveu metade da vida na Suíça disse que Priscila é que está a dar lá fora. O avô disse que sim senhor, mas só se fosse Priscilla com dois éles como o Marcello Caetano, para que toda a gente saiba que não há comunistas em nossa casa e que somos gente de bem. A Lurdinhas estava a borrifar-se para o Marcello mas gostou da ideia porque com o éle a mais ficava ainda mais chique. Mas atenção, que ninguém mencione esta homenagem à prima-vizinha da frente, coitada, tem dois dos três filhos no Ultramar. Que matem os pretos todos e voltem rápido, sãos e salvos, meus ricos filhos!

A Priscilla da Conceição nunca se deu com comunistas, no entanto, nada quis ter a ver com o regime que dali a nada foi posto na rua. Portanto, se lhe perguntarem porque não se chama Priscila em português, ela vai responder, peremptória e nariz-empinadamente, que a mãe assim a batizou por ser fã da Priscilla Presley, que é uma verdadeira senhora e que um dia também ela haveria de casar com um cantor romântico e ser uma estrela da televisão numa espécie de Dallas nacional, porque muitas vezes fazem-se cá novelas a fazer lembrar as do estrangeiro.