terça-feira, 17 de novembro de 2020

Preia-mar, Baixa-mar

 Ora cheias

        Ora vazas

São marés

        Dentro de mim.

Sobrávamos Lá Nós

Sobrávamos lá nós. Quantos? Talvez nem meio. Talvez nem meio fossemos. Todos os outros já tínhamos perecido pelo meio da jornada. Todas essas versões de alter-egos nossos já tínhamos morrido, algures, distraídos com qualquer miudeza, qualquer pedra brilhante ou inseto mais colorido que acabámos por seguir até escorregarmos num abismo ou perdermos o grupo.
O último bastião do movimento estava ali, agora, nesse momento derradeiro, entre a espada e a parede. E eu só conseguia andar em frente, tal era o meu medo da parede. Lisa como um conceito. Limitante. E tu seguravas a espada de forma tão frouxa, e ela enterrava-se mal no meu peito. As lágrimas eram já mais que o sangue. E claro que as lágrimas são um sangue muito mais sério, sobretudo menos espalhafatoso, e foram elas mesmo lavando o rasto vermelho escuro, velho, do sangue poluto. Eu avançava com os ombros adiantados fugindo inutilmente à parede junto da qual eles haviam de ser sepultados. A ponta da espada era torta e ferrugenta, o gume gasto. Surpreendia-me não te ser demasiado pesado um instrumento assim. Tremias das mãos e não sei se também te tremia a voz, porque não falaste, até ao fim.