domingo, 24 de maio de 2020

Existir

Existir sempre foi mais dissonante do que o pop nos ensinou.

Forte na terça
frágil na quinta 
quantas vezes acordei como um leão
e passei o dia a fugir.
Entre os dias e as gentes
e o que eles gritam,
há uma certa esperança na vida
de ela nos dar não sei o quê
mas que valerá mesmo a pena,
toda a pena,
e esse mantra corre desde lá atrás,
no fundo,
e acompanha-nos 
e há uma altura em que começamos a dar por ele,
a ouvi-lo,
caminhando no seu embalo.

Mas depois vai-se andando,
vai-se andando e o tempo passa quando se anda,
e o tempo que passa também é uma distância.
E essa batida de fundo
esse som magnífico
vai parecendo mais longínquo,
mais difuso,
vai-se andando
mais implausível,
anda-se mais
ousa-se na análise e reconhece-se — mais ridículo.
E chega um dia que dás conta
que há tanto tempo que não o ouves
que não podes garantir se alguma vez ele soou.

*

Gritamos tantas verdades
e tantas mentiras
todas com a mesma convicção.

Nada é certo
mas a probabilidade acumulada do erro
é esmagadora.

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