Na primeira noite em Saigão, num dilúvio,
um velho táxi amarelo foi meu alívio.
O indiano que evangeliza o mundo que chora.
Do seu pára-brisas sorri-me uma senhora
de delicadas mãos pousadas no peito.
Bem tapada e composta, mulher de respeito.
Europeia, és cristã, arriscou a sentença.
Respondi, fui, senhor, forçada à nascença.
Mas ele não queria a história da minha crença
Só que os meus ouvidos escutassem a sua.
Suspirei não mais cair na falcatrua.
Correra todo o mundo nos anos sessenta,
boémio, só a capa no estofo não aparenta.
Abraçada à minha mochila ouvi-o atenta.
Pai sique, mãe hindu, a mulher islâmica,
não era ele tonto de suplicar a cerâmica
Aos tantos forasteiros atrás no banco
mandou calar mais o seu deus branco.
Mas num dia escuro o médico lê cancro,
firme e lacónico, sem contraditório.
A medicina nada deu para esse peditório
Correu a Bangalore por salvação,
peregrinou a cada templo com devoção.
Nem gurus, nem shiva, buda ou o corão.
O vizinho padre arrastou-o ao seu território.
Sabes, Cristo curou-me antes do ofertório.
No trânsito imenso em noite de monção,
alagado por um crescente rio Jordão,
o indiano que evangeliza o mundo com fervor
compõe a cruz de malta torta no retrovisor,
proclamando a sua salvação aos setenta
e batismos redentores nas margens do delta.